
Pode ser impressão de gente que desconhece cinema, pode ser coincidência na pequena seleção de filmes, pode ser um sinal. Afinal, a arte sempre nos ofereceu sinais do mundo que ela antecipa ou pelo qual ainda está contaminada. Se fosse possível escolher, prefiro o diagnóstico da contaminação e não o da profecia. Os poucos filmes da
31ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo aos quais assisti são melancólicos, tristes. Como disse, são poucos. Três croatas e um austríaco. Todos com suas feridas, às vezes sublimadas, mas sempre lá.
A guerra civil que corroeu a ex-Iugoslávia dirigida pela fascista Sérvia e que transformou completamente a fisionomia do lugar após a separação de Croácia, Bósnia-Herzegovna, Eslovênia, Macedônia, e, finalmente, Montenegro e Sérvia, está lá subentendida, nas entrelinhas; numa frase, pequena, sentida, remoída.

Já não se trata de
Terra de Ninguém, mas da angústia que ficou. Do stalinismo que precisava cair e do confronto estúpido entre os trabalhadores. No final de tudo, bósnios são os oprimidos preferenciais, e até mesmo nos filmes são tidos como estúpidos e ignorantes. Mas não é a leveza denunciante de
Caminhão Cinza pintado de vermelho.
São os casos de
Treseta,
Encarando o Dia e
Armin. Os bósnios são o trapo e os sérvios aqueles a quem se deve engraxar o sapato. Os croatas oscilam entre o centrismo da submissão aos últimos e o compartilhamento da opressão aos primeiros.

Aí vem o filmes austríaco... Nova metáfora que a burguesia utiliza bem... o nacionalismo vingativo e maniqueísta, explorador. O mesmo que há no Brasil contra bolivianos e paraguaios, há na Áustria contra ucranianos, russos e iugoslavos. Também podemos citar os estadunidenses humilhando os mexicanos em
Nação Fast food. Os paralelos são perfeitos. É lógico que por mais que os diretores estadunidenses se esforcem, sempre escorregam... na superficialidade, o que não ocorre em
Import, Export. Momentos tensos de preconceito, humilhação, tristeza, hipocrisia e pervesão. O retrato do mundo pelo menos parece real... ele está fétido. Mas sempre poderemos transformá-lo e arte ainda será um dos caminhos.